As crises e as birras são muito semelhantes e por essa razão, são por vezes difíceis de distinguir. Mas a sua distinção é importante para sabermos como agir ou que estratégias aplicar para em ambos o casos.
Todo o comportamento é uma forma de comunicação
Uma coisa que temos de ter sempre presente em mente é que qualquer comportamento é uma forma de comunicação. Quando uma pessoa chora, grita, morde, se auto-agride… Está a tentar comunicar algo e o nosso desafio é tentar entender o que nos está a tentar dizer para ajudá-la por sua vez a comunicar de uma forma mais eficaz. Quais as principais diferenças? Uma é orientado para o objetivo vs sobrecarga.
Birras
Uma birra normalmente resulta da frustração de não conseguir o que quer naquele momento – seja um brinquedo, seja capaz de abotoar as suas próprias camisas ou não querer ir para a cama. Ou a frustração de não conseguir o que quer, não ser capaz de fazer o que quer, ou mesmo de não conseguir comunicar o que quer de maneira apropriada.
Na birra a pessoa consegue ter o controlo sobre o seu comportamento e o comportamento termina quando ela consegue o que quer. Pode parar o tempo necessário para garantir que alguém está a olhar para ela e voltar à birra assim que for o centro das atenções. As birras tipicamente param quando consegue o que quer ou quando se apercebe que não irá conseguir o que quer ao agir desta forma.
Crises
Nas crises, a pessoa não tem controlo sobre os seus comportamentos e também não tem por objetivo conseguir algo em específico. O que está a fazer é libertar energia causada por uma sobrecarga emocional ou sensorial.
Uma pessoa com autismo pode ter uma crise se se sentir sobre-estimulada ou bombardeada. As crises acontecem geralmente quando há informação em demasia para ser processada pelo seu cérebro.
Para algumas pessoas, um parque de diversões pode produzir informação sensorial, incluindo cenários, sons e cheiros, mais depressa do que a pessoa os consegue processar.
Em outros casos, a perspectiva de ter que tomar um grande número de decisões pode provocar uma crise. Para pessoas com autismo, algo tão simples como experimentar novas roupas para levar para a escola ou fazer um teste importante pode causar uma crise.
Uma crise normalmente continuará mesmo após ter conseguido o que a pessoa queria porque, em muitos casos, ela nem sabe o que quer. As crises tipicamente terminam de uma destas formas: a pessoa fica esgotada, encontra um ambiente sossegado com menos informação sensorial, ou nós respondemos de forma diferente à habitual.
Concluindo
As birras precisam de uma plateia. Uma crise por sua vez pode acontecer com ou sem plateia. Ela pode acontecer quando a pessoa está sozinha. É a resposta de uma sobrecarga de estímulo externo que leva a uma explosão emocional.
Como lidar com uma birra?
As birras e as crises são coisas diferentes, mas sugerimos que uses uma abordagem semelhante com cada uma delas:
Para lidar com uma birra, reconhece os desejos da pessoas que acompanhas sem ceder a eles. “Compreendo que queres mais fruta. Vais poder comê-la ao jantar”. Depois ajuda-a a usar uma forma de comunicação mais útil para conseguir o que quer. “Quando tiveres acabado de gritar e conseguires falar calmamente, diz-me que tipo de fruta vais querer para sobremesa”.
Quando lidamos com uma birra, é um comportamento indesejado para conseguir algo e a melhor forma de trabalhar este comportamento de modo a que desapareça é não ceder ao que a pessoa quer.
As explicações nestes momentos são fundamentais – explicar que não irá conseguir o que quer através daquele comportamento, que existem outras formas de pedir (sem gritar, sem chorar…). No caso de não ser possível dar aquilo que ela quer, mesmo que o faça através de comportamentos desejáveis, informamos a pessoa de que não irá obter o que quer e porquê e oferecemos alternativas do que ela pode ter ou fazer naquele momento (antes do comportamento indesejado começar).
Ignorar estes comportamentos funciona para algumas pessoas, mas para outras, ignorar pode levar a que a birra se torne numa crise, pela sobrecarga emocional e sensorial que causa. Caso isso aconteça, o que sugerimos é que fiques ao lado dela, mas sem dar tanta atenção. Sê o seu porto seguro e o que iremos fazer é a hetero-regulação, ou seja, ajudar a pessoa a ficar calma, estando nós calmos (como se fôssemos espelhos). É fundamental sentires-te calmo(a) nesta altura, pois se estiveres calmo(a), a pessoa acabará por se acalmar.
Como lidar com uma crise?
Para lidar com uma crise, ajuda a pessoa a encontrar um sítio sossegado para se acalmar. Uma ambiente calmo oferece ao cérebro a possibilidade de ter um momento para processar a informação sensorial. Convida-a a ir para um lugar sossegado e senta-te calmamente ao seu lado para seres uma presença que lhe traga alguma tranquilidade.
Oferece massagens de alta pressão (como abraços mais fortes) se isso funcionar com ela – normalmente funciona muito bem para pessoas hiposensíveis tácteis. Podes também oferecer coisas que sabes que a poderão acalmar (festas no cabelo, apertar as mãos/pés, ficar deitados na cama, cantar uma música calma baixinho…). O objetivo é reduzir a quantidade de informação recebida por ela e ela encontrar em ti um porto de abrigo que lhe traz a calma e tranquilidade que naquele momento precisa.
Está atento(a) ao padrão comportamental da pessoa que acompanhas. Perceber o que desencadeia uma crise pode ser muito útil. Se tiveres consciência dos factores que a despoletam, poderás criar estratégias para antecipar o comportamento e este nem acontecer.
A pessoa é sensível a sons? Se estiveres num lugar com demasiada estimulação sonora sugere -lhe colocar os abafadores de sons nos ouvidos antes de chegarem ou procura um lugar mais calmo para a levar. Os sintomas que aparecem antes da crise acontecer podem ser variados como a pessoa ter mais comportamento estereotipado, pedir para sair do espaço ou simplesmente fugir, começar a ficar mais agitada, etc… Se perceberes os factores que provocam a crise poderás preveni-la antes que aconteça.