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Estratégias para desenvolver a autonomia

18 de Novembro de 2020 – vencerautismo

Há momentos em que nós temos que ser colo e mostrar à pessoa com autismo o quão úteis somos e o quanto a queremos ajudar. Mas também é importante entender quando é o momento de começar a desenvolver a autonomia da pessoa, para que seja capaz de fazer tarefas sozinha e que se sinta bem por poder fazê-las sozinha. Desenvolver a autonomia é um passo natural no desenvolvimento de todos. Esta pode acontecer mais tarde, de forma diferente, mas é importante promovermos a autonomia, dentro do que é possível para a pessoa.

Antes de mais, é importante salientar, que quando falamos em autonomia, na verdade esta palavra/conceito, engloba muita coisa: desde conseguir comunicar, estar numa interação, ter flexibilidade para aceitar mudanças, alterações de planos, etc. Quando queremos desenvolver a autonomia da pessoa com autismo é importante ter em conta todas as áreas do desenvolvimento: tais como o contacto visual, a comunicação não verbal e comunicação verbal, o tempo de atenção conjunta, a flexibilidade, a saúde e o comportamento. De facto a autonomia engloba que a pessoa se desenvolva em todas estas áreas e não apenas em algumas, pois esta será a base para que futuramente possa ter uma vida autónoma.

Sendo a autonomia um conceito tão geral é importante sermos bastante específicos no que queremos trabalhar para ajudar a alcançar o nosso grande objetivo: a pessoa ser autónoma. Desta forma, sugerimos que comeces pela base, com os desafios atuais da pessoa hoje e que trabalhes e ajudes a pessoa a superar esses mesmos desafios. Temos de olhar para o seu processo de desenvolvimento e aprendizagem como uma escada. Em que temos de subir degrau a degrau, etapa por etapa para conseguirmos chegar à nossa meta final. Definir como objetivo trabalhar a autonomia da pessoa com autismo é demasiado complexo, nesse sentido é fundamental começar com objetivos curtos e específicos que sejam mensuráveis e que a ajude a passar para a próxima fase.

Atividades da vida diária

Agora que já tens a big picture, vamos dar alguns exemplos de atividades da vida diária que consideramos que também estão relacionados com a autonomia, mas numa fase em que a pessoa com autismo já se encontra mais conectada com o mundo à sua volta:

Atividades da vida diária mais simples

O modelo é sempre o mesmo: Modelar – Criar jogos/desafios com base nos interesses da pessoa – Modelar

Tarefas diárias como fazer o seu pequeno almoço, ajudar a limpar ou pôr a mesa

Para tarefas deste género é importante que exista uma modelação da nossa parte. Alguma das pessoas com autismo são aprendizes visuais e precisam de ver as coisas para perceberem como se fazem. Numa fase inicial é importante mostrares à pessoa como se faz e convidá-la a participar da dinâmica. Mas fá-lo de uma forma divertida e entusiasta.

Por exemplo, em vez de fazeres o pedido de ela pôr a mesa, podes apresentar-lhe um desafio como: colocar a música de pôr a mesa e convidares a pessoa a colocar a mesa contigo antes da música acabar para conseguirem ganhar a vossa missão! Podes cronometrar o tempo que ela demora e o tempo que tu demoras para ver quem ganha o jogo do Super Campeão de Meter a Mesa. Tudo é válido desde que seja interessante e motivador para a pessoa. Adapta a tarefa àquilo que ela gosta. Podes, nalguns momentos, adicionar apenas pequenos elementos como colocar uma música que gosta ou no final de ela completar a tarefa, dar-lhes um mega hi5 pelo excelente trabalho que fez. Vê o que funciona com a pessoa e dá asas à tua criatividade.

Vestir sozinha, calçar as meias, atar os sapatos, etc.

Muitas vezes estas pequenas coisas podem ser bastante desafiantes para a pessoa com autismo. Nessas alturas é muito importante recorremos a uma atitude descontraída e divertida para a ajudar a relaxar e mostrar como a tentativa-erro é perfeitamente normal e que quando acontece, até se divertem a tentar e tentar. Modela o comportamento que gostarias que a pessoa tivesse e torna o desafio em algo divertido. Exagera nas expressões faciais, nas “palhaçadas” e ao mesmo tempo incentiva a pessoa a tentar. Sê a sua maior claque e mostra-lhe que acreditas na sua capacidade de conseguir!

Higiene pessoal como lavar os dentes

Temos um artigo especialmente dedicado a este tema com várias dicas que podem ajudar. Espreita aqui.

Atividades da vida diária mais complexas

Partilhamos de seguida algumas atividades de autonomia que, em alguns casos, já engloba saídas no exterior ou contextos um pouco mais complexos. Contudo, é de salientar, que para trabalhar esta área num contexto não tão controlado, é importante que a pessoa esteja preparada para tal. Para que não seja um momento de stress adicional para ti ou para ela, pois senão os efeitos acabarão por ser contraproducentes.

A pessoa com autismo não tem autonomia para ir às compras sozinha?

Mas talvez tenha autonomia para levar o lixo até ao contentor. Ou para esperar por nós junto ao carro, enquanto fechamos a porta de casa. Ou para sair do carro e ir até ao portão da escola sozinha.

A pessoa pode não ter autonomia para fazer um percurso todo sozinha, mas pode ir fazendo partes do percurso sozinha com supervisão, “Podes ir indo até à paragem e esperas lá por mim”. Ou dar autonomia dentro do supermercado: “Podes ir buscar o pacote de arroz da marca X e vir ter comigo” ou “…e pagar enquanto eu espero cá fora”. Começa com pequenas coisas e à medida que vais tendo respostas positivas, vai aumentando gradualmente o grau de desafio.

A pessoa não tem autonomia para fazer a sua própria comida?

Mas talvez possa ajudar na preparação do jantar. Ou ajudar a pôr a mesa e a levantá-la no final e/ou a pôr a louça na máquina.

Treinar a preparação e realização de uma refeição: pensar o que vamos comer, ver se temos em casa, fazer compras, cortar, descascar, cozinhar, pôr a mesa, e depois tratar de toda a arrumação são coisas nas quais podes incluir a pessoa com autismo. Obviamente que continuamos a ajudar (a questão da supervisão e orientação numa fase inicial). Mas podemos deixar que faça muita coisa sozinha e que decida sozinha “como é que queres que corte o pimento?” “como quiseres, escolhe tu”. Demora mais tempo, claro… mas é importante dar esse tempo e deixá-la treinar essas competências.

Estes são apenas alguns exemplos, a pessoa com autismo não tem que fazer as mesmas coisas que as outras pessoas fazem, mas pode fazer outras. E tem tudo a ver com o nível em que ela se encontra.

A terapia ocupacional pode ser muito importante para desenvolver a autonomia. E um terapeuta ocupacional pode ser uma grande ajuda na aplicação de estratégias práticas e concretas para trabalhar estas questões de autonomia mais complexas no dia-a-dia.

Em suma, como podemos então desenvolver a autonomia da pessoa com autismo?

  • Começamos com tarefas simples que sabemos que a pessoa consegue fazer. Trabalhamos a base para depois podermos subir degrau a degrau, até chegar ao nosso objetivo final.
  • Treinar as competência/tarefa com apoio, havendo numa primeira fase uma modelação da nossa parte.
  • Treinar as competência/tarefa com supervisão, orientação e acompanhamento.
  • Celebrar quando a pessoa consegue ou, mesmo que não consiga totalmente, se esforça para o conseguir. Celebrar cada tentativa da pessoa para a motivar a continuar a tentar até conseguir.
  • Tornar a atividade/tarefa divertida e prazerosa sempre que possível e recorrer às grandes motivações e interesses da pessoa.
  • Valorizar a sua autonomia e reforçar positivamente/mostrar como ao fazer isso te está a ajudar.
  • Adaptar, flexibilizar e aceitar a fase em que a pessoa se encontra, usando sempre a premissa de que apesar de ainda não fazer o que queremos é capaz e irá conseguir.
  • Dar responsabilidades à pessoa e confiar na sua capacidade de superação.

As pessoas podem ter autismo mas não significa que não conseguem fazer as coisas. Podem ter dificuldade, alguma resistência, mas não quer dizer que um dia não irão conseguir e o nosso papel em todo o processo é fundamental.

Apesar de querermos facilitar o mundo e o dia-a-dia da pessoa com autismo, temos que entender que por vezes ao fazê-lo estamos a limitar a pessoa. E o que parece no momento mais simples e fácil, vai dificultar o seu desenvolvimento, a sua aprendizagem, o seu dia-a-dia e a sua relação com os outros. Para além de que, desenvolver a autonomia da pessoa também promove o seu bem-estar, a sua realização pessoal e auto-valorização. Citando Maria Montessori, “Qualquer ajuda desnecessária é um obstáculo na aprendizagem”.

Confiem nas pessoas com autismo e criem as oportunidades para elas vos conseguirem surpreender! 😊

Podes aprender mais sobre este tema através das nossas Masterclasses:

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