As pessoas dentro do espetro do autismo têm dificuldades no processamento sensorial. Isto porque, podem sentir e filtrar os estímulos que recebem do mundo exterior de uma forma bem diferente da nossa. Nesse sentido, adaptar o ambiente às características da pessoa com autismo é fundamental.
Desafios sensoriais
A verdade é que diariamente todos nós somos bombardeados com uma série de estímulos. No entanto, e de alguma forma, conseguimos filtrar e eliminar os estímulos que não nos interessam para o momento. Temos uma espécie de funil no nosso cérebro que nos permite efetuar essa seleção. No caso do autismo não se passa da mesma forma. Dependendo de como está a pessoa com autismo, tudo pode entrar a um máximo volume, ao mesmo tempo e à mesma intensidade – sendo difícil para ela filtrar todo esse bombardeamento sensorial.
Primeiro exercício
Para perceberes melhor o que estamos a dizer, pensa numa situação tua normal do dia-a-dia, como por exemplo, passear na rua. Da próxima vez que fores dar um passeio, fica atenta a todos os estímulos que vais recebendo do exterior. Quando falamos em estímulos falamos de todos (olfativos, visuais, auditivos, táteis…). Observa bem a quantidade de informação que recebes numa situação tão banal como sair à rua. Se formos a ver, somos bombardeados por uma série deles, desde carros a apitar ou a andar, semáforos / luzes / símbolos luminosos, pessoas a falar / andar em diversos sentidos, cheiros de comida / perfumes das pessoas que se cruzam connosco, etc. A quantidade de estímulos que recebemos, sobre os quais não temos controlo, são imensos. No entanto, temos esta capacidade de nos abstrair disso tudo, sendo que acaba por não interferir no que estamos a fazer.
Segundo exercício
Agora faz este segundo exercício: imagina um cenário completamente avassalador para ti, que seja quase insustentável permanecer nele demasiado tempo pois a probabilidade de saíres com dores de cabeça, cansado/a ou mal disposto/a é gigante. Para algumas pessoas pode ser um contexto como um concerto com música aos berros que não gostam nada, um shopping em época natalícia onde reina a confusão, a voz de uma pessoa que para ti é extremamente irritante, um perfume específico que só de cheirar te deixa enjoado/a ou com uma enxaqueca, um metro em hora de ponta a abarrotar de gente, etc.
Agora que já imaginaste uma série de cenários que por norma tens dificuldade de suportar, imagina estares em contacto com esse tipo de cenário diariamente. Quando sais de casa, quando vais trabalhar, quando vais a casa de um amigo, quando vais jantar fora, etc. Porque é assim que muitas vezes as pessoas com autismo se sentem – num aeroporto cheio de gente, com imenso barulho / luzes / cheiros / confusão, em que só querem fugir para encontrar algum equilíbrio interior.
Quando nos sentimos assim a nossa vontade de socializar é zero e só queremos procurar um sítio sossegado, ou fazer algo que nos ajude a relaxar. No caso das pessoas com autismo passa-se exatamente o mesmo. E é importante que, volta e meia, elas possam ter essa oportunidade para se conseguirem auto regular e, por conseguinte, estarem também mais tranquilas.
Adaptar o ambiente para ajudar a ultrapassar os desafios sensoriais
A pergunta que se impõe é “O que podes fazer para ajudar a pessoa com autismo com os seus desafios sensoriais?”. Podes fazer mais do que aquilo que possas achar! Claro que a terapia de integração sensorial, ocupacional, snoezelen ajuda muito, mas em casa ou em outros contextos também podes ajudar a pessoa com autismo, ao adaptar o ambiente às suas necessidades.
Antes de mais, é importante perceber em que áreas a pessoa tem mais desafios e arranjar soluções / alternativas para a ajudar quando estiver confrontada com ambientes ou estímulos que tem dificuldade em processar e, por consequência, tolerar. Se, por exemplo, a pessoa é muito sensível a sons, podes propor que ela use uns abafadores de som antes de entrar no ambiente. Se for sensível a certas luzes, ou à luminosidade, podes propor que ela use óculos de sol. E, numa fase inicial, talvez haja sítios que poderás evitar, como por exemplo supermercados, shoppings, metros em hora de ponta, etc. Se queres ajudar a pessoa com autismo a tolerar e a aceitar esses estímulos é importante que seja um processo gradual.
Começa com coisas simples
Começa a adaptar o ambiente em casa com coisas simples que podem ajudar em muito a pessoa a estar mais tranquila e regulada a nível sensorial. Prepara um espaço livre de distrações. Tenta arranjar um espaço que não tenha imagens na parede, coisas espalhadas pelo chão, telefones a tocar, pessoas a falar, explosão de luzes, a televisão alta, etc. Tenta arranjar um espaço sossegado e livre, ao máximo, de distrações e estímulos.
Coloca nesse espaço coisas que a pessoa com autismo gosta e procura de forma espontânea. Pode ter mantas e almofadas grandes no chão para ela se poder deitar, se quiser. Pode ter algum cheiro que ela goste ou procure para se acalmar. Alguma música ou som de fundo, ou ainda alguma luz mais suave. Pode ter texturas, objetos, brinquedos que notas que a ajudam a acalmar e que ela própria procura quando está mais agitada.
É importante que este espaço em casa esteja acessível à pessoa com autismo. É importante que ela saiba que pode ir e ter acesso quando ela sentir necessidade disso. Ao disponibilizar um cantinho mais tranquilo para o qual ela possa ir quando se sentir mais estimulada, do ponto de vista sensorial, irá ajudá-la a proteger-se desse bombardeamento sensorial e a autorregular-se para permanecer calma, reduzindo de igual forma comportamentos mais desafiantes e crises.
Faz uma lista dos estímulos que perturbam a pessoa e das coisas que a ajudam a acalmar-se, ou que a ajudam a permanecer tranquila. Ao fazer esta lista, será muito fácil para ti antecipar e prevenir situações de sobrecarga sensorial e posterior desregulação, bem como a adaptar o ambiente! 😊