Muitas vezes sem notarmos abordamos as pessoas com autismo com perguntas e mais perguntas, cheios de entusiasmo por querermos tanto que nos respondam, comuniquem e interajam connosco. A verdade, é que a intenção é boa, mas isso podemos estar a exagerar e, pelo contrário, estar a afastar a pessoa. Calma, respira fundo…. Vamos tentar perceber porquê e encontrar melhores formas de incentivarmos as pessoas com autismo a comunicar verbalmente connosco.
1. Ouve mais
Sim, ouvir mais. Entendemos perfeitamente a tua vontade de falar para que a pessoa também fale. Contudo, acredita, quanto mais falas, menos espaço estás a dar para a pessoa falar. Oferece espaço para ela falar quando quiser, ouve as suas palavras, frases, sons como se fosse a primeira vez que os ouves. Observa, escuta com toda a sua atenção. Isto vai ser importante para conseguires, mais tarde, interagires.
Não tenhas receio de existirem momentos de silêncio. A pessoa vai perceber que lhe estás a dar tempo e espaço para falar, caso deseje. Assim, mostras que estás atenta a ouvir, em vez de estares sempre a pedir que seja a pessoa com autismo a fazê-lo. Ao “abraçar” o silêncio, a pessoa pode ficar mais calma e ter mais vontade de falar contigo. Lembra-te: quando a pessoa fala, ela está a pedir em primeiro lugar que oiças e não que fales. Na verdade, a comunicação é composta por duas partes, o falar e o OUVIR. Todavia, muitas vezes, da importância de ouvir.
Da próxima vez que estiveres a interagir com a pessoa com autismo, foca-te em falar menos e ouvir mais. E espera pelo resultado. Vais ficar surpreendido/a vendo que, ao falar menos, a pessoa, provavelmente, vai falar mais! Fica atento!
2. Investe na conexão
Ao estares constantemente à procura de respostas por parte da pessoa com autismo vais estar a pressioná-la, o que faz com que apenas diga algumas palavras, frases ou sons, mas desconectada de ti. Por outro lado, é muito mais fácil incentivares a comunicação verbal quando já existe uma interação e conexão. Por isso, investe na conexão entre ti e a pessoa com autismo, sem pressões. Investe na interação com jogos e brincadeiras, investe no juntares-te à pessoa, em criar jogos e atividades dentro das motivações da pessoa, etc. Assim, vais ajudar a pessoa a “querer” realmente comunicar contigo.
3. Dá tempo
Quando, efetivamente, pedires à pessoa para dizer uma palavra, por exemplo, em seguida, faz uma pausa e dá-lhe tempo e espaço para a dizer. Quando as pessoas com autismo têm dificuldade em falar, pode ser muito complicado para elas responderem prontamente ao nosso pedido. Há pessoas que demoram mais do que outras, somos todos diferentes, por isso é tão importante saber ouvir a pessoa e conhecê-la bem, para, assim, adaptares a tua interação à sua forma de ser.
4. Atenção às perguntas
Como falado no início, por vezes estamos tão ocupados a fazer perguntas às nossas crianças que esquecemo-nos de as ouvir e de tentar perceber se, na verdade, essas perguntas são mesmo enriquecedoras. Então, deixamos-te algumas perguntas para refletires e fazeres a ti próprio/a para perceberes se estás a usar as perguntas de forma enriquecedora para promover a comunicação verbal.
Porque estou a fazer esta pergunta? Estou a fazer a pergunta porque realmente quero saber a resposta ou é uma pergunta à qual não estou à espera que a pessoa responda? Sou eu que vou dar a resposta?
Se a resposta for sim, é uma pergunta retórica, por isso, não perguntes. Faz o que fores fazer sem acrescentar a pergunta. Se a questão não é realmente necessária e não é dado espaço à pessoa para responder, estás a comunicar que, responder a perguntas, não é importante e que, eventualmente, não te importa, na verdade, a resposta.
A pergunta que estou a fazer é apenas para ouvir aquilo que eu e a pessoa já sabemos?
Por exemplo, estás a perguntar-lhe de que cor é o objeto só para o ouvir dizer de que é azul? Se sabes que a pessoa sabe isso, então pergunta-lhe outra coisa, algo que possa ser mais enriquecedor e interessante para a pessoa com autismo. Algo que não tenha resposta certa ou errada. Por exemplo, podes perguntar-lhe quem é que ela acha que é o familiar mais divertido ou preguiçoso. Sê criativo/a, divertido/a e com atitude para que a pessoa ganhe interesse em comunicar contigo.
Estou a usar a pergunta para iniciar uma conversa?
Fazer perguntas é uma forma de iniciar conversas, mas existem outras. Dessa forma, outras formas de iniciar conversas podem ser mais interessantes para a pessoa com autismo com quem estás a interagir e, assim, facilitar a comunicação. Partilha uma história, um comentário ou um pensamento sobre algo relacionado com as motivações e interesses da pessoa. Por exemplo, se a motivação for dinossauros, podes dizer algo como: “Se eu vivesse no tempo dos dinossauros, faria uma carruagem de madeira e punha em cima do dinossauro, para poder andar em cima deles e ir para onde eles fossem”.
Depois de fazeres esse comentário, pára, observa e espera para ver se a pessoa tem algum comentário a acrescentar ou se tem alguma reação ao que disseste. Assim, estarás a inspirar a pessoa a comunicar espontaneamente os seus pensamentos e ideias sobre o que disseste e vais ajudá-la a partilhar os seus pensamentos e a construir as suas próprias frases.
Estou a usar a pergunta para iniciar uma atividade?
Em vez de usares uma pergunta, inicia simplesmente a atividade com a pessoa. Por exemplo, em vez de perguntares se quer pintar, pega nas canetas e no papel e começa a pintar sozinho/a, mas perto dela, de maneira que a pessoa te possa ver. Em pouco tempo, a pessoa irá mostrar-te se também quer pintar ou não.
Estou a usar a pergunta para testar?
Existem outras formas de interagir sem que pareça que a estás a testar a pessoa. Por exemplo, podes incluí-la numa decisão de forma indireta, em vez de perguntares “Que cor de papel é que queres?” podes dizer algo como “Uau, temos imenso papel colorido aqui, estou a pensar que cor é que havemos de escolher primeiro”, e depois dar tempo para haver uma reação por parte da pessoa.
5. A Criatividade é bem-vinda!
Porque não falar através de personagens, bonecos ou fantoches? Somos a favor de que toda a criatividade e originalidade é válida e a utilização de bonecos pode ser o primeiro passo para que pessoa se sinta mais à vontade para praticar a conversação. Principalmente no início, para algumas pessoas, pode ser mais fácil ter uma interação com o boneco do que com uma pessoa. Isso pode acontecer por a pessoa ainda estar desconectada de nós e/ou por ter dificuldade numa conversa direta. É também uma oportunidade fantástica para usar o seu personagem preferido – a sua motivação. Para a pessoa com autismo pode ser mais fácil comunicar e responder às perguntas da sua personagem ou boneco preferido. Experimenta e aguarda pelo resultado.
Essencialmente, DIVIRTE-TE com estas ideias e as interações com a pessoa que acompanhas! 🙂